Review: “Entender a China” de Giada Messetti

Review: “Entender a China” de Giada Messetti

Ouvimos falar da China todos os dias, mas o que sabemos sobre ela?

O que fomos ensinados a pensar deste país que representa, para nós, ocidentais, o longínquo oriente?

Se queremos entender a China temos de abandonar, por momentos, as cores da nossa formação cultural, pôr de lado as categorias de julgamento ocidentais que nos são instintivas e deixarmo-nos destabilizar por um contexto cultural, histórico e com valores completamente diferentes dos nossos.

Da Mulan – princesa da Disney que as pessoas da minha geração conhecem bem – a mil outras referências que nos ajudam a caracterizar o Dragão Asiático, Giada Massetti leva-nos numa viagem pelo Celeste Império e ajuda-nos a compreender “o outro” que a China representa para a cultura ocidental.

Este livro não é uma história da China, é uma maneira mais rápida de lá chegar, através do senso comum e das suas idiossincrasias.

Entender a China passa por entender a sua relação com a língua e com a escrita – mesmo que em 1949 a população fosse composta por 90% de analfabetos. Passa por compreender que “escrever com água” pode ser uma atividade recreativa e que o número 4 e o número 9 são especiais por causa da forma como se pronunciam.

A língua e a escrita também nos explicam porque é que caso sejamos convidados a ir a casa de uma família chinesa fica sempre bem levar uma estatueta de jade que represente uma couve chinesa.

Entender a China obriga-nos a sair do esquema ocidental que promove o livre-arbítrio e aceitar que os indivíduos fazem parte de um sistema orgânico e estão subordinados ao seu contexto. A postura ritual e a piedade filial são imperativos morais.

Na China, as boas relações pessoais podem ter mais peso do que a assinatura de contratos e há um termo para designar essa rede que regula estas relações: os guãnxi – muitas coisas na vida podem depender de bons guãnxi.

As trocas de ideias que implicam embates diretos são descartadas, a mentira nem sempre é negativa e o conceito de vergonha assume-se como central: Há 113 expressões diferentes para descrever o sentimento de vergonha.

Reescrever a história é uma prática usual e a expressão “humilhação nacional” é essencial para compreendermos algumas das intransigências em relação à política externa; as guerras ao ópio, os conflitos sino-japoneses, a revolta boxer e o Movimento 4 de Maio são parte dessa narrativa – se o Ocidente teme o totalitarismo, a China teme o caos.

Entender o Mandato Celeste, a propensão dos chineses para o utilitarismo e a sua não-relação com o passado fisicamente vivido também se torna essencial para conseguirmos ultrapassar a distância entre as conceções culturais.

Em tempo recorde, a China passou de “fábrica do mundo” de produtos a baixo custo para a vanguarda de setores tecnológicos cruciais como incontestável exportador de mercadorias de alta qualidade. Trata-se, agora, de criar um modelo económico sustentável e é esse o desafio que Xi Jinping enfrenta, com vários riscos a ultrapassar.

Entender a China passa por aceitar que se levem os pássaros domésticos a passear, que as comidas yin acalmam e as comidas yang produzem hiperatividade, que “a cópia” não é um insulto ao original, muito pelo contrário, é um sinal de apreço, e que “não-agir” não significa manter-se inerte.

Giada Messetti fala na primeira pessoa e apresenta-nos este país desconhecido de uma forma tão clara que é impossível que não se acenda uma ponta de fascínio pelo Celeste Império.

E sim, é verdade que comem cão, mas não comem cavalo.

 

Rock & Rolla

 

Entender a China é um livro Ediorial Presença. Compra-o aqui: https://www.presenca.pt/products/entender-a-china